Cotidiano

24 de abril de 2023

21 anos de Libras: ‘é um verdadeiro desafio pessoas ouvintes não entenderem a importância do bilinguismo’

Embora a educação inclusiva seja um direito constitucional, os desafios de um ensino não bilíngue causam impactos no nível de formação escolar entre os surdos

Nesta segunda-feira (24), a Língua Brasileira de Sinais (Libras) completa 21 anos de promulgação da lei que reconhece a comunicação e expressão de pessoas surdas no país. Segundo o IBGE, cerca de 10 milhões de brasileiros são surdos ou deficientes auditivos e boa parte deles usam a Libras como auxílio para comunicação. Um estudo feito pelo Instituto Locomotiva e a Semana da Acessibilidade Surda aponta que há baixos percentuais de formação educacional entre esta mesma população.

Segundo o estudo, cerca de 7% dos surdos brasileiros têm ensino superior completo, 15% frequentaram a escola até o ensino médio, 46% até o fundamental, enquanto 32% não têm grau de instrução. Destes, 9% nasceram com a condição e 91% adquiriram ao longo da vida. Mas, para além dos dados numéricos, há também histórias que representam superação em meio às dificuldades para se ter as mesmas oportunidades que os ouvintes.

Pós-graduada em Libras e Educação de Surdos e voluntária da Associação do Amor Inclusivo (AAI), organização não governamental (ONG) localizada em Sorocaba, Jessica Barros, de 38 anos, conta que o processo durante sua formação de ensino básico não foi uma tarefa fácil, “havia muita discriminação”, por mais que tentasse se encaixar entre os demais alunos da época.

“Minha mãe teve rubéola durante a gravidez, então eu já nasci com a deficiência auditiva. Quando pequena, os meus ‘colegas’ da escola não entendiam o porquê de eu não ouvir direito. Eles tiravam bastante sarro de mim por conta disso. E então, para mostrar que eu não era surda, decidi não usar o aparelho auditivo. Eu fazia um esforço enorme no ouvido para tentar ouvir, o que me fez perder muito mais da audição ao longo do tempo. E foi assim até os meus 18 anos, até eu ter uma aluna surda que também passava pelo mesmo que eu passei”, relata.

Jessica prefere ser referida como ‘surda que ouve’, ou seja, ela é, na verdade, uma deficiente auditiva com perda de grande parte da audição, diferentemente de um surdo profundo – que não escuta. É uma diferença sutil diante da discriminação enfrentada. Afinal, por mais que ela tenha conquistado acesso à educação, e lutado por ela, acaba não sendo a realidade de muitos outros surdos que não encontram condições para concluir o ensino básico.

O apoio fora da escola também é necessário

Inaugurada em 2017 com o objetivo inicial de acolher surdos e deficientes auditivos, hoje a Associação do Amor Inclusivo (AAI) tem a missão de inserir 20 assistidos na sociedade de forma digna, como foi com Jessica. “Sempre tive muito apoio na AAI, em especial a prof.ª Maria Angela, que acreditou no meu potencial. Recebi a orientação dela para fazer a minha Pós em Libras e Educação de Surdos e, em 2019, também a me inscrever para vagas do estado na área da educação. Foi assim que iniciei a minha atuação como professora interlocutora na rede estadual”.

A importância da comunicação bilíngue

São comemorados 21 anos da Lei de Libras, a qual abriu a possibilidade de superação das barreiras de comunicação entre surdos e ouvintes. Algumas pessoas, como Jessica, lutam para que os ouvintes consigam conversar com os surdos utilizando o bilinguismo em todos os lugares da sociedade brasileira. “Sempre me interessei por Libras. E sempre digo como é importante falar; falar com a voz e, por que não, com as mãos também. Isso ajuda muitas pessoas”, completa.

Curso de Libras

A luta por uma sociedade bilíngue é constante também para a ONG em que Jessica participa como voluntária, onde é oferecido um curso básico da língua para todos os interessados.
A turma de maio poderá participar das aulas todas às terças-feiras, das 19h às 22h, se inscrevendo pelo número de WhatsApp: (15) 99774-1042. O curso necessita de um investimento no valor de R$ 380,00 (à vista), ou duas parcelas de R$ 200,00.
A AAI está localizada na Rua Pedro Álvares Cabral, nº 564 – Vila Progresso.