Quando deixou a vida que vivia no sítio em uma estrada entre Tietê e Porto Feliz para trás e se mudou para Sorocaba, aos 30 anos, José Morelli não tinha ideia do quanto ele seria importante para a indústria de bebidas sorocabana. No último dia 25 de junho, Morelli comemorou um século de vida, sendo a maior parte dela em Sorocaba, ao lado da finada esposa Zenaide Morelli, filhos e netos. Nesses 100 anos de vida, desde que chegou à cidade, ele acompanha as notícias do Cruzeiro do Sul e é considerado um dos assinantes mais antigos do jornal.
A família Morelli veio da Itália e a cidade onde ele passou sua infância e juventude, – Tatuí -, tem muitos descendentes de italianos. “Meus avôs vieram de Verona, na Itália, mas nunca fui para lá, nem saí do Brasil. O meu prazer, quando jovem, era viajar pelo interior”, disse ao mostrar uma foto tirada durante um passeio a gruta de Porto Feliz.
Antes mesmo de se mudar para Sorocaba, José Morelli recebeu uma proposta de emprego no antigo Grupo Schincariol (hoje BrasilKirin). Ele abraçou a oportunidade e se mudou para a rua Sevilha, na Vila Hortência, zona leste da cidade. Após 10 anos, foi convidado a integrar a fábrica de bebidas Momesso. “Lá, fiquei por 20 anos, fiz parte da construção e da ideia ao lado de outras pessoas. Não sou formado. Costumam me chamar de químico, mas no papel não tenho nada, sou químico de prática. Quando perguntavam o que fizeram para a fábrica evoluir tanto, as pessoas respondiam que foi o químico José Morelli o responsável pelo desenvolvimento”, relembrou. Quando saiu da Momesso, aos 60 anos, decidiu se aposentar.
Aos 100 anos, Morelli está com a saúde em dia e a mente também. “Graças a Deus estou bem, não consigo andar muito porque cai, quebrei o fêmur e precisei operar, mas fora isso, está tudo bem, e a mente também”. Pai de três homens e quatro mulheres, uma falecida, Morelli é um exemplo para seus filhos. Um deles, Oraci Morelli, foi o responsável pela fundação da primeira indústria do segmento dental de braquetes em toda a América do Sul, localizada em Sorocaba, a conhecida Dental Morelli. “Ele fez tudo sozinho, eu ajudava um pouco, mas ele fez tudo por conta própria”, recordou.
Na leitura diária do jornal Cruzeiro do Sul, Morelli começa pela sua editoria preferida: esportes. O centenário relembra as inúmeras copas do mundo das quais teve a oportunidade de acompanhar. “Gostava muito de assistir aos jogos do Brasil, na época do Pelé e Rivelino”. No coração de torcedor, ele também carrega o Palmeiras. “Sou palmeirense, da época de Ademir da Guia, mas nunca consegui assistir a um jogo no estádio, acompanho pela rádio e TV”.
Quando perguntado qual foi a notícia mais marcante em sua vida, respondeu rapidamente, citando uma do mundo político. “Marcou a minha vida quando votei no Getúlio Vargas e vi a notícia que ele foi eleito, em 1950. Embora alguns digam que não, para mim ele foi um grande presidente”. A morte de Vargas também é destacada por ele como um grande momento do jornalismo, noticiada em manchete do jornal Cruzeiro do Sul em 25 de agosto de 1954.
Entre outras notícias, o impeachment do presidente Fernando Collor, no final de 1992, também é mencionado por ele e, nos temas atuais, Morelli comenta o assunto mais debatido na área da saúde nos últimos dois anos: a Covid-19. “Acompanho a pandemia desde o começo, tenho visto que muitos lugares não estão usando máscara, mas acho que isso não está certo, o vírus ainda está aí”.
Morelli acompanhou a evolução do jornal impresso, rádio, televisão e ainda viu o jornalismo ser transformado em formato digital com a chegada da internet. Assistiu momentos marcantes da história de Sorocaba, do Brasil e do mundo. Sem dúvidas, conhecer uma figura como José Morelli, além de ser uma enorme satisfação, é também uma oportunidade de ouvir histórias que somente um homem com um século de vida pode nos contar. (Virgínia Kleinhappel Valio) (Cruzeiro do Sul)