Bem-Estar

27 de julho de 2022

Cientistas avançam na busca da causa da ‘hepatite misteriosa’

Estudos britânicos associam doença nas crianças ao vírus AAV2

Dois estudos britânicos sugerem uma associação do quadro de hepatite misteriosa em crianças ao vírus adeno-associado (AAV2), que foi encontrado em 96% das amostras analisadas. Os cientistas não encontraram ligação direta com a Covid-19, que havia sido apontada como potencial causa dos quadros. Submetidas ao site MedRxiv como pré-impressões, as pesquisas aguardam análise de pares.

De abril até 8 de julho, 35 países relataram 1.010 casos prováveis da hepatite aguda grave em crianças, conforme boletim mais recente da Organização Mundial de Saúde (OMS). Também há registro de 22 mortes. Quase metade (48%) dos casos são da Europa. O Brasil tem apenas duas notificações, de acordo com a tabela da OMS.

O boletim da organização destaca que testes laboratoriais excluíram os vírus da hepatite A, B, C, D e E nessas crianças. Em relação aos casos europeus, o Sars-CoV-2 (vírus causador da covid) foi detectado em 16% deles — embora os dados estejam incompletos, destaca a OMS –, e o adenovírus (vírus causador do resfriado comum) em 52%.

Os dois novos estudos, que foram conduzidos independentemente, mas de forma simultânea, jogam luz sobre um outro vírus que pode estar desempenhando papel significativo na alta de casos, o adeno-associado. Da família dos parvovírus, normalmente “inofensivo” e sem capacidade de se replicar sem um vírus “auxiliar”, como o adenovírus ou o herpesvírus, foi encontrado em níveis muito altos no sangue e no fígado dos pacientes amostrados.

Com isso, os pesquisadores apontam que a coinfecção com dois vírus — o AAV2 e um adenovírus ou, menos frequentemente, um herpesvírus — pode melhor explicar o avanço da doença hepática grave. Contudo, pedem colaboração internacional para elucidar ainda mais o papel do adeno-associado.

As novas descobertas também colocam em xeque a suspeita de elo com a Covid-19. Os cientistas de Londres não encontraram Sars-CoV-2 no fígado dos pacientes, e os escoceses apontaram que apenas dois terços das crianças tinham anticorpos contra a infecção.

Judith Breuer, professora do Instituto de Saúde da Criança da University College London, disse que espera que os resultados possam tranquilizar pais preocupados com a Covid. “Nenhuma das equipes encontrou nenhuma ligação direta com a infecção por Sars-CoV-2. Nossos dados, no entanto, apontam para o AAV2 no fígado e/ou sangue dos casos como o biomarcador mais forte para a hepatite”, frisou.

Emma Thomson, professora clínica e consultora em doenças infecciosas da University of Glasgow, destacou que é preciso melhor entender sobre a circulação do AAV2, que não é rotineiramente monitorado. “Pode ser que um pico de infecção por adenovírus tenha coincidido com um pico de exposição ao AAV2”, sugeriu. (Estadão Conteúdo)