Por Marcos Bercial
Dizem que só temos um coração. Eu, um profissional da medicina, obviamente, não poderia discordar de uma informação tão básica. Mas, às vezes, confesso: dá uma vontade…
É que quando nos tornamos pais, o coração de nossos filhos também parece nosso, te juro. É como se nosso órgão vital criasse raízes, expandisse, ganhasse novos contornos batendo dentro de outro peito.
Isso começa quando nos deparamos com eles ainda bebês…
Aqueles corações pequeninos, corpinhos frágeis. Que crescem, crescem, crescem… E conforme o coração deles dilata, nosso amor também só aumenta, à mesma medida.
Quando a gente compreende esse sentimento, talvez seja o momento mais próximo do entendimento sobre o tal do amor incondicional, que dizem tanto por aí.
Rubem Alves descreveu bem tudo isso em um texto chamado ‘O Pai’. Um dos trechos mais belos é o seguinte:
“Quem é pai tem o coração fora de lugar, coração que caminha, para sempre, por caminhos fora do seu próprio corpo. Caminha, clandestino, no corpo do filho. Dito pela Adélia: ‘Pior inferno é ver um filho sofrer sem poder ficar no lugar dele.’ Dito pelo Vinícius, escrevendo ao filho: ‘Eu, muitas noites, me debrucei sobre o teu berço e verti sobre teu pequenino corpo adormecido as minhas mais indefesas lágrimas de amor, e pedi a todas as divindades que cravassem na minha carne as farpas feitas para a tua…’
É lindo viver as mais grandiosas fases de conquistas de nossas vidas. No meu caso, ser um médico que conseguiu transformar tantas vidas nesses anos todos me orgulha, com certeza. Mas, sinceramente, o que mais tem me deixado emocionado mesmo é a caminhada da Julia.
Pai coruja não poderia ficar mais em êxtase: observar minha filha esbanjando o talento de artista e sendo reverenciada por muitos; notar que vem seguindo um caminho semelhante, da medicina, da transformação de histórias de pessoas a partir do cuidado, do zelo com a saúde. Esse orgulho nada e nem ninguém pode comprar. E poucos podem entender.
Dia desses, Julia esteve comigo durante uma manhã de trabalho. Ela ainda está no primeiro ano da faculdade, tem uma longa trilha pela frente, mas sei que nos dará muitas alegrias. Aliás, desde sempre foi nosso principal motivo de felicidade (minha e da Juliana). E, durante esse crescimento dela, essa busca por realizações, queremos sempre que possível estar aplaudindo de perto.
Afinal, ela ocupa e continuará ocupando o palco mais bonito de nossas vidas.
Até o fim.