AFETadOS

28 de abril de 2023

De novo, novamente e outra vez

@tutehumor

Os passos foram rápidos. Ele tinha pressa. Entra como um vento forte, impetuosamente. Chega ao consultório como se já houvesse estado ali inúmeras vezes. E esta, era a terceira vez. A porta que entrara apenas duas vezes, pareceu tão conhecida. Assim como se via, um conhecedor exímio de si. Olhar altivo. Seus olhos estavam fitados em mim. Atônito. Eu o convido para sentar-se no sofá. Abaixa a cabeça, inspira e expira com força e atende o convite. Antes de sentar, para, movimenta seu corpo como se fosse sair de repente. Olha para o divã, lugar que na primeira sessão dissera que não fora feito para ele. Levantou a sobrancelha esquerda enquanto falava de si, do tanto que era. Abriu bem os olhos e balançou a cabeça levemente de um lado para o outro enquanto riu de uma maneira sarcástica e, precisamente incontida…

Antes que eu pudesse dizer algo, Bráulio diz que sabia que precisaria apenas sair dali. Que eu me surpreenderia com tudo que diria e que jamais conheceria um caso tão rápido assim.

Seu corpo estava incomodado, todo atrapalhado. Levanta a cabeça, como se desafiasse a mim. Solta com força o seu todo. De uma só vez. Para, pensa e solta as primeiras palavras…

Olhar fixo.

– “Preciso mesmo estar aqui?

O silêncio paira.

Sepulcral.

Minha impressão era que o tempo estava acelerado para ele. Assim, como sua vida estava. Acelerada.

– “Essa tristeza dela ainda não compreendi”. Bravo, testa franzida, desta vez a voz estava ainda mais firme. “Eu não estava preparado para algo tão profundo”, foi assim que ele citou, mais uma vez a ex.

Bráulio que pelo visto sempre se voltava para seu mundo e, fazia deste, o único, se encontrava ali, longe de si. E ao mesmo tempo tão cheio.

Ele que sempre mirou na multidão e fez dela seu chão, estava ali, naquela fim de tarde outonal. Agitado, descontrolado. Equivocado.

– “Eu não entendo, muito menos me arrependo. Porque ela reclamava? Dizia que eu nunca estava e, eu sempre ali! Estranho, não acha? Ela era exagerada, se queixava da minha cara amarrada. Quer saber? Agora eu irei viver! ”

Ele se levanta devagar. Inspira com força e profundamente. Parecia decidido, mas ainda, perdido. Um verdadeiro desconhecimento e afastamento de si. Um não ser. Um não saber…

Aos poucos, Bráulio traceja outros caminhos, os mesmos destinos. Livre. Solitário. Vazio. Inacabado.

De novo, novamente. Outra vez.

Angélica Fontes

Psicanalista Winnicottiana, Educadora e Professora de Psicanálise e aprendiz de Psicologia.