Faz pouco tempo que me dei conta de algo um tanto particular ao meu respeito.
Eu gosto gotas. E embora eu seja hiperativa, desligada e em constante movimento: reparo nelas.
Na pontinha da videira no jardim da minha mãe. Após uma tarde de chuva fazendo de copo uma bromélia. No pires do meu café quente. Na janela de um taxi que você gruda o olho bem pertinho. No vidro de um restaurante com vista para a terra da garoa e do caos. Gotas.
Eu gosto da simplicidade que são revestidas, como quem veste insignificância. Gosto desse ar de miudeza que, na verdade, é pura armadilha.
É que a gota não faz alarde. Não mata a sede. Não tem cara de grande tempestade. Ela não quer ser o centro, não quer o palco.
Mas como quem não quer nada, ela transborda o copo. Tem o dom-detalhe do desempate. É ela que laça o peito. Uma menina atriz que finge ser coadjuvante, mas é personagem principal.
Te chamo para uma prova prática. Feche os olhos.
Qual momento vem na sua mente?
(Prevejo) Do nascimento, a batida no coração. Da infância a embalagem da bala de iogurte. Do amor, a cicatriz do lado direito do quadril. Da briga, palavra cuspiu no sentimento. Da viagem, a primeira música que você cantou na estrada. Do beijo, o olhar que fez o convite.
É que se engana, meu bem, quem faz da folha morada para os olhos,
no fim é pela gota que a gente vai,
é pela gota que a gente fica.