Ainda não sei, mas vou saber

18 de setembro de 2023

Televisão

Todas as noites escuto o som da televisão ligada.

Especialmente nas noites de calor, quando deixo a janela do quarto aberta.

Não sei de qual apartamento vem esse ruído, só sei que ele não me incomoda.

Na verdade é reconfortante.

Por um estranho motivo a minha mente relembra da época da infância, quando estava deitada em minha beliche e morria de medo de algum espírito aparecer para mim.

Naquela época, ouvir o som da televisão ligada era sinal de que ainda tinha alguém acordado, de que eu não estava só, a mercê de um espírito oportunista qualquer.

Se você me perguntar se hoje ainda tenho medo deles, dos espíritos, posso dizer que outras coisas substituíram seu lugar para assombrar minhas noites.

O fato de ter que ser otimista quando tudo está dando errado, é uma delas.

De sorrir das próprias limitações.

De ter medo do cartão não ser aceito ao fim da compra.

De não ser suficiente para aquelas que dependem somente de mim.

É, eles, os espíritos, não me assustam.

Sinto que eles têm algo mais importante a fazer do que ficar sondando o quarto de uma mulher quase quarentona e cheia de inseguranças.

E o som da TV do apartamento vizinho me faz pensar que não estou tão só.

Tem mais alguém acordado tarde da noite.

Tem mais alguém espantando os pensamentos enquanto consome um programa qualquer.

Tem mais alguém vendo o tempo passar e não fazendo nada.

Me apego nessa sensação.

Nem a minha sala está vazia.

Nem a minha cama.

Estão lotadas do sentimento doce que vem de um tempo em que alguém cuidava de mim.

Aline Amorim

Jornalista, Pós-graduada em Acessibilidade, Diversidade e Inclusão, mãe de meninas e pets.