AFETadOS

31 de março de 2023

Uma Puta e qual destino?

@hassanhajila

A dose foi forte.
Nuances de uma vivência doída, dolorida, vendida, extravasavam em cada poro, cada pedaço, historicamente entregues como um presente não querido. Preterido.
A dose tem sido forte…
Parcamente, felicitações ao mulherio foram desejadas neste mês de luto, luta. Tempos em que as marcas da misoginia e sexismo exigem doses realmente fortes.

– Ô, seu Zé, vê mais uma! Manda aquela forte com limão…
O Zé sempre observador. De longe acompanhando o meu porre de liberdade*. Calado.
A essa altura as doses já tinham subido pra onde deveriam e começaram a flexibilizar os resquícios do meu dia. Na verdade, de uma vida.
– E se deitássemos o machismo no Divã?
Ousado pensamento. Abusado.

Penso que ele chegaria ao consultório com a cara lavada, olhar deboísta, andar impreciso e com um discurso tão pronto, provável, relatando sem se dar conta e, escancaradamente uma fragilidade construída, rastros e traços de um ambiente falhado, de um menininho que supostamente não foi amado pela pátria puta que o pariu.
Penso, também, que chegando, escolheria a poltrona que se destaca e, provavelmente levaria um tempo para sacar sua sacada.
Sim, talvez, fosse preciso colocá-lo em seu devido lugar – no Divã.
Lugar, mesmo que simbólico, aonde as máscaras se depõe, aos poucos. E nos vemos sós. Nus.
Com certeza seria assunto seus objetos grudados, aqueles não largados, os não internalizados, muito menos respeitados!
Gritaria seu afogamento no desejo, apontando a falta de limite do seu dentro…
Repetições, também viriam, mostrando um garotinho perverso que nunca conheceu e reconheceu o outro!
Fruto de um ambiente raso e limitado, que fez dele um embotado.
.
Fechamos este mês comemorativo. Longo. Intenso. Insano. Perigoso.
Doses ainda serão necessárias. Várias doses.
Por aí e por aqui, seguimos observando em resistência, contra essa moral e identidade de dominação frágil e perversa. Ainda estamos longe…
Mas, aos poucos, cada vez mais, juntas!
E qual destino?

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..
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** Letra de Gonzaguinha, “Mesa de bar”.

Angélica Fontes

Psicanalista Winnicottiana, Educadora e Professora de Psicanálise e aprendiz de Psicologia.