Repenseria

22 de setembro de 2022

6 passos para uma vida financeira mais saudável

Crédito: JESHOOTS . COM | Unsplash

No final da coluna passada, convidei você a se perguntar qual é a primeira palavra que vem na sua cabeça quando você pensa em dinheiro. Não fiz essa pergunta por acaso.

Já te contei que dinheiro é um tema muito mais de humanas do que de exatas. Para lidar com ele de forma saudável, mais do que saber fazer contas, é importante olhar para dentro.

Será que a sua relação com o dinheiro está saudável?

Para te ajudar a avaliar isso, trago hoje os seis passos que fazem parte da Jornada para uma Vida Financeira mais Saudável. Essa é uma metodologia autoral que desenvolvi na Repenseria, a partir das consultorias que presto para empresas do mercado financeiro.

Primeiro, dá uma olhada na jornada completa:

  1. Sonhar
  2. Planejar
  3. Ganhar
  4. Administrar
  5. Acumular
  6. Realizar

Em qual etapa será que você está neste momento?

Vou te mostrar um pouco da minha abordagem para cada uma delas. Vamos nessa?

  1. Sonhar

O mundo nunca foi fácil, mas os últimos anos estão especialmente puxados, né? Para encarar a realidade que sempre se impõe sobre as nossas vidas (e encontrar ânimo para sair da cama todos os dias), é preciso sonhar.

E acreditar que, apesar de não termos o poder de acabar com todos os problemas das nossas vidas, conseguimos, sim, melhorar algumas coisas. Até várias, talvez.

Você já está cansada de saber que é importante começar a guardar dinheiro. Eu não preciso ficar repetindo isso aqui.

O que você talvez não saiba é que dar o primeiro passo para guardar dinheiro fica um pouco menos difícil quando a gente tem um objetivo claro.

Quais são os seus sonhos hoje?

Viajar? Trocar de carro? Largar seu trabalho chato e começar a empreender? Sair das dívidas? Comprar uma casa própria? Cuidar do futuro financeiro dos seus filhos?

Não importa qual seja o seu desejo. O importante é você ter clareza dele, priorizá-lo em relação aos outros e calcular quanto ele custa.

  1. Planejar

Quem está nessa etapa já decidiu parar de alimentar sonhos inatingíveis dentro da cabeça e começar a transformá-los em objetivos concretos no papel. Mas o que isso significa na prática?

Viajar é um sonho. Guardar R$ 3.000 para as próximas férias é um objetivo.

Você percebe a diferença?

Quando você coloca um preço e um prazo no seu sonho, consegue criar um planejamento para chegar lá. E recalcular a rota na largada ou ao longo do caminho, se necessário.

Vamos supor que você queira realizar esse objetivo daqui a um ano, nas suas próximas férias. Dividindo o preço do seu sonho pelo tempo que tem pela frente até chegar lá, você descobre que precisará guardar R$ 250 por mês (é só dividir R$ 3.000 por 12 meses).

Agora você está pronta para avaliar se essa meta é viável.

É possível guardar R$ 250 nos próximos 12 meses? Se sim, talvez você precise rever alguns gastos. No que será que dá para economizar?

Se não, talvez seja necessário recalcular a rota. E fazer uma viagem mais barata nas próximas férias. Ou adiá-la por mais um ano, para que tenha mais tempo para guardar dinheiro, sem precisar comprometer tanto o seu orçamento.

Para juntar R$ 3.000 em dois anos, você precisa guardar R$ 125 por mês (R$ 3.000 dividido por 24 meses). Metade do valor anterior. Já facilita um pouco mais, né?

Perceba que não existe certo ou errado aqui. Lidar bem com o dinheiro significa levantar as informações necessárias para fazer escolhas conscientes, com base no que é possível para você neste momento.

Fazer isso não é tão difícil, mas, na maioria das vezes, demanda um pouquinho de coragem e um montão de tolerância à frustração. Está ficando mais claro agora porque eu falo tanto que dinheiro tem mais a ver com sentimentos do que com planilhas?

Fazer escolhas é um dos maiores paradigmas do ser humano. Afinal, como dizem por aí, para cada escolha, uma renúncia. E uma consequência, acrescento.

A questão é: o quanto você está disposta a se responsabilizar pelas suas escolhas?

É… eu sei que é duro. Também é para mim.

  • Alô, terapeuta? Posso fazer uma sessão extra?
  • Alô, mãe? Posso voltar para a sua barriga?
  • Alô, deus? Sou eu de novo…
  1. Ganhar

Eu adoro trabalhar, mas prefiro trabalhar poucas horas por dia, folgar três dias por semana e tirar duas férias longas por ano. Infelizmente, isso ainda não é possível para mim hoje.

Mas quem sabe um dia? Já até calculei o preço desse meu sonho. 😉

Ao contrário de mim, tem gente que odeia trabalhar. Também tem quem seja viciada em trabalho.

Não importa de qual time você seja. Se você não é herdeira, nem sugar baby, vai ter que trabalhar para pagar suas contas, se não quiser depender de outra pessoa.

Vivemos numa sociedade capitalista. Ou você vira o tabuleiro, como bem nos encoraja a inteligentíssima Rita Von Hunty, e assume as consequências ou segue a regra do jogo. E assume outras consequências. Algum preço você vai ter que pagar.

Partindo da premissa de quem escolhe seguir as regras do jogo, qual é a sua principal fonte de renda hoje? É ela o pilar principal da sua vida financeira.

Você está feliz com o seu trabalho atual? Ou, ao menos, a rotina do seu dia a dia profissional é gostosa a maior parte do tempo? Está satisfeita com o seu salário?

Essas podem parecer perguntas ingênuas em um primeiro momento, mas, na verdade, as respostas para elas dão pistas de como a sua vida financeira pode ser mais saudável.

Afinal, a maioria das pessoas passa a maior parte da vida trabalhando, ainda que poucas tenham o privilégio de poder fazer melhores escolhas profissionais aqui no Brasil.

A geração X (1960 – 1980), por exemplo, viveu o trabalho como uma obrigação que todos precisam assumir sem reclamar, submetendo-se a tudo, sem questionar.

Acabou amarga.

A geração Y (1980 – 1990), dos Millennials, da qual eu faço parte, acreditamos que precisamos encontrar um grandioso propósito de vida para que o trabalho faça sentido.

Acabamos no burnout.

A geração Z (1990 – 2010) ganhou o apelido de geração nem nem (nem trabalha, nem estuda) e subiu nos trending topics nas últimas semanas com o surgimento do termo quite quitting (do inglês, demissão silenciosa).

Acabou desesperançosa.

Aguardemos a geração Alpha (2010 – ?), que nasceu num mundo totalmente digital e já enfrentou uma pandemia. Como será que eles vão se relacionar com o trabalho?

  1. Administrar

Não vou mentir. Essa é a parte mais chata da jornada. Mas, ao mesmo tempo, uma das mais importantes.

Aqui, eu preciso admitir que cuspo um pouco para cima quando digo que dinheiro é mais coisa de humanas e reconhecer a importância dos números e das planilhas.

Não tem como se relacionar bem com o dinheiro sem saber quanto você ganha e monitorar de perto o quanto gasta. O que pode mudar é a forma como você pode fazer isso.

Existem pessoas que gostam de anotar os gastos em um papel. Outras amam aqueles aplicativos de gerenciamento financeiro superautomatizados. Tem gente até que é tão boa de conta que só de bater o olho no extrato bancário, já sabe se o negócio deu ruim.

Já eu criei uma planilha simples que reúne todas as minhas despesas mês a mês.

Defino metas semanais para os meus gastos variáveis, como supermercado, bares, Uber e delivery, e acompanho o andamento das contas e do saldo bancário toda semana, no fim das tardes de sexta-feira.

O bom é que, dependendo da gravidade do negócio, já abro logo uma garrafa de vinho sozinha para afogar as mágoas e… sextou! ¯\_(?)_/¯

(Jovens, não me julguem. Eu já contei ali em cima que sou Millennial. Um beijo pro ICQ, pro MSN, pro Orkut, pro EduBATERA – meu crush virtual da época que dava para bater-papo no Uol sem CAM -, pra minha mãe e pra Xuxa).

Mas deixando a bagaceira de lado e voltando ao tema, foi esse o jeito que encontrei de organizar minhas contas para não me sentir mais ansiosa toda vez que passo o cartão.

Além disso, esse meu controle financeiro semanal também me permite perceber logo quando as contas saem dos trilhos.

Dessa forma, consigo ajustar a rota a tempo, quando necessário, e evitar aquele susto horrível de quando a gente descobre do nada que entrou no cheque especial no fim do mês. Credo!

Na maioria das vezes, esse meu planejamento dá certo. Algumas vezes não. E tudo bem. 

No mês seguinte, eu tento corrigir onde errei e começo tudo de novo. Uma vida financeira saudável não precisa ser perfeita, mas demanda muita paciência, persistência e resiliência. 

Haja autoconhecimento!

  1. Acumular

Com suas contas organizadas, você, finalmente, está pronta para dar um passo decisivo na sua vida financeira: criar o hábito de poupar todo mês.

Eu costumo dizer nas rodas de conversa sobre dinheiro que faço com mulheres que mais importante do que guardar bastante, é guardar sempre.

Uma pergunta muito comum que elas me fazem é: quanto eu preciso guardar por mês?

A resposta técnica para essa pergunta é: de 10% a 20% da sua renda, para começar. E se puder aumentar essa proporção com o passar do tempo, melhor.

Mas a melhor resposta para esta pergunta não é técnica. É empática, sem deixar de ser assertiva: quanto for possível para você, desde que você comece a guardar agora.

Comece com R$ 100, com R$ 50, com R$ 10 ou com R$ 5. Não importa. Apenas comece.

Quanto você pode começar a guardar agora?

Meu convite é que você pause a leitura deste texto neste momento e agende uma transferência mensal programada da sua conta corrente para a sua conta digital remunerada, para um fundo DI, para um CDB de liquidez diária, para o Tesouro Selic ou até para a sua conta poupança, se for essa a opção mais fácil para você.

Neste primeiro momento, a rentabilidade do investimento importa menos do que criar o hábito de guardar todo mês.

Criar o hábito de poupar é a parte mais difícil. Mas uma vez criado, você estará pronta para o próximo passo: iniciar a sua própria estratégia de investimento. Ou seja, escolher onde investir.

Aprender como escolher os melhores investimentos também desperta muitas dúvidas nas pessoas, então vou falar só sobre esse assunto na minha próxima coluna, combinado?

  1. Realizar

A jornada para chegar até aqui é longa. Sonhar, precificar, definir objetivos, priorizar, lidar com a frustração, reajustar a rota, se responsabilizar pelas próprias escolhas, organizar as contas, cortar gastos, acompanhar o saldo bancário todo mês, criar o hábito de poupar e definir uma boa estratégia de investimento. Ufa!

Quem consegue completar todas essas etapas, merece um prêmio.

E terá.

Depois de concluir todos esses passos, você terá exatamente o que mais deseja hoje.

Nesta sexta e última etapa da jornada para uma vida financeira mais saudável, é hora de realizar o sonho pelo qual você tanto batalhou nos últimos anos.

Tudo lindo. Agora o céu é o limite, certo?

Mais ou menos.

Sabe o que eu escuto muito de mulheres que conseguiram evoluir na carreira, ganhar melhor e acumular muito dinheiro?

Falas carregadas de culpa.

Existem uma série de fatores que explicam esse sentimento, tanto individuais, quanto estruturais. Mas esse também já é assunto para uma outra coluna. Prometo que vou escrever sobre a culpa feminina na relação com o dinheiro mais para frente.

Por enquanto, vamos parar por aqui. Já tem bastante coisa para você repensar e começar a transformar na sua vida financeira, né?

O segredo é fazer uma mudança de cada vez. Com paciência e sem pressa. Vamos juntas!

E até a próxima coluna.

Jenifer Corrêa

Jornalista formada pela USP, com 15 anos de experiência na área de Comunicação, gerindo projetos de conteúdo e educação financeira. Atuação em grandes instituições financeiras, como B3, Serasa Experian, Itaú e Santander, na agência de notícias Thomson Reuters e nas startups GuiaBolso e alt.bank. Pós-graduada em Administração de Empresas pela FGV. Fundadora da Repenseria, consultoria independente de comunicação e conteúdo, especializada em finanças.

  oie@repenseria.com