Xilogravura de Marcelo Soares
Sentiram o coração pulsar.
A respiração descompassada denunciava o deparar com todo o desconhecido.
Corpos que se encontravam pela primeira vez.
Duas vidas. Duas histórias.
Histórias que a partir dali seriam escritas e inscritas num espaço-tempo. Num corpo-poema.
Receber a presença de um outro corpo, de um outro ser, singular, sustentar de maneira bastante intensa e com leveza a imprevisibilidade de cada movimento. Alteridade.
Temporalidades.
Tempo.
…
Ouve-se um som.
Um misto de emoções percorria todo o corpo.
Era como se a cada acorde fossem convidados a escreverem movimentos, sutilezas de cada instante.
Entre braços, o abraço.
O conter o mundo. O criar naquele instante um mundo.
O confiar. Fiar juntos. O saber que a cada movimento solto, separado, alguém sempre espera.
Dançar é contar histórias. A nossa.
Em cada movimento entregue naquele espaço, no abraço, contamos cada contato que construímos lá atrás, quando ‘dançávamos” no embalo, sob o cuidado, juntamente com nosso cuidador principal. É lá no colo, no contato, no compasso, nas trocas, no ambiente proporcionado, que são criadas condições para que possamos aprender a dançar.
É lá que ganhamos lugar para experimentarmos nossa capacidade inata de criação, que podemos vivenciar as condições de uma total adaptação às nossas necessidades, o que significa uma adaptação aos nossos ritmos corporais, é lá, nesta dança, que podemos acontecer, aprendemos a tecer, conscientes de um corpo habitado.
Por meio da criatividade, expressões humanas tomam forma e manifestam estados intelectuais e artísticos que moldam a realidade na qual vivemos, compreendendo-se que no criar nos desenvolvemos como humanos e civilização. Nesse sentido, é pela via da criatividade que o indivíduo sente que a vida é digna de ser vivida.” (Winnicott, 1975)
Me pegue de novo no colo. **
Sendo assim, sou mais forte.
…assim sou mais eu.
*Forró No Escuro, Luiz Gonzaga.
**Carece de explicação, Dominguinhos.
Referência: Winnicott, D. (1975). O Brincar e a Realidade. Imago Editora.