Medito sobre o nada. E se ele não fosse nada creio que meditaria de volta sobre mim. E nós nos inter-relacionaríamos como um conjunto de coisas que se misturaram mesmo sem querer que assim fosse.
Vamos aos pares e ímpares das locuções, colocar os pontos nos is e desmistificar o que há de ser desmistificado. Pois já é passado o momento de descobrir o encoberto: é momento de tirar
coisas de matéria fina que se encontram veladas por fina cortina – coisas de matéria grossa que se encontram enoveladas por grossa morfina.
E embora o sentido me despreze pouco me importa: mal sabe ele que também o desprezo levemente. Não por reciprocidade incumbida mas por constatar: o sentido só é último quando é primeiro, inverter sua ordem torna-o mais confuso que nunca.
Lá fora chove a chuva que me lava a alma, cujas gotas gélidas tornam-me petrificada em um estame impessoal.
Vivo em excesso. E por tanto exceder o ato de viver considero-me morta. Uma aparente contradição me traz as raízes da certeza: se tememos a morte por amar a vida; que possamos morrer logo para não temer coisa alguma.
Mas não é uma morte de um todo. É apenas uma parte: a essência mortífera que nos ata ao chão, como âncora malograda. Essa essência que tira e retira a paz de uma vida provida de amedrontamentos.
Portanto eu sem pestanejar renuncio a tal essência e deixo-a esvaziar por si mesma, como balão de festa a fugir da nossa boca – temendo também o estourar súbito da morte.